Risco com PT seria maior do que com Bolsonaro, diz ex-BC

Na foto, o economista Luiz Fernando Figueiredo, 54, dá entrevista em seu escritório. Ele foi diretor de política monetária do Banco Central de 1999 a 2003, é sócio fundador e principal executivo da Mauá Capital, que administra R$ 6 bilhões em investimentos

O economista Luiz Fernando Figueiredo, 54, foi diretor de política monetária do Banco Central de 1999 a 2003, é sócio fundador e principal executivo da Mauá Capital, que administra R$ 6 bilhões em investimentos – Rafael Hupsel/Folhapress

Ex-diretor do Banco Central e sócio fundador da gestora de investimentos Mauá Capital, Luiz Fernando Figueiredo diz que os riscos que a volta do PT ao poder representaria são maiores do que os de um eventual governo Jair Bolsonaro (PSL). 

Na sua opinião, o programa apresentado pelo petista Fernando Haddad na corrida presidencial demonstra falta de preocupação com a situação frágil das contas do governo e por isso alimenta desconfiança entre os investidores.

Bolsonaro, ao contrário, reconhece a gravidade do problema e tem uma equipe preparada para combatê-lo, diz Figueiredo, que minimiza sinais de desencontro entre o candidato e seu principal assessor econômico, Paulo Guedes. 

Na semana passada, Bolsonaro desautorizou uma proposta apresentada pelo economista a investidores, que incluía a criação de um imposto sobre transações financeiras parecido com a antiga CPMF. 

Figueiredo também não vê perigo de ruptura das regras do jogo democrático com uma vitória de Bolsonaro, que foi apontado como uma ameaça à democracia brasileira pela revista britânica The Economist, bastião do liberalismo.

Por que a eleição presidencial inquieta os investidores? 

A situação fiscal do país é insustentável. Corrigir o problema exigirá um esforço que só dará resultado se houver firmeza desde o início. A confiança só voltará quando a sociedade se convencer de que estamos no caminho da estabilidade.

O país está parado faz cinco anos, e ninguém vê nada no horizonte no longo prazo. O pressuposto é que o próximo governo fará o ajuste necessário, porque será inevitável. Como hoje há muita dúvida sobre o que vai acontecer, a bolsa cai, o dólar sobe. 

O problema é que há duas vertentes no debate eleitoral. A maioria dos candidatos reconhece que o problema existe e precisa ser resolvido, e oferece diferentes soluções. A outra vertente, que é a do PT, diz que o problema fiscal não existe, que é só estimular o crescimento que tudo se resolverá.

Jair Bolsonaro promete acabar com o déficit público em um ano. Geraldo Alckmin (PSDB), em dois. Esse irrealismo não preocupa também?

Candidatos em campanha sempre exageram. É normal. O que incomoda é ver um candidato recusar o diagnóstico correto, como Haddad. E todas as pessoas no seu entorno na mesma linha, achando que não há nenhum problema.

Eles dizem que vão aumentar o crédito e estimular os investimentos e o consumo. Como assim? Os bancos públicos estão com vários problemas. É como dar veneno ao paciente. Não adianta fantasiar, como a presidente Dilma Rousseff fez em 2014. Cinco minutos depois de ser reeleita, quis atacar o problema que escondeu na campanha e não conseguiu.

Haddad distanciou-se do economista mais heterodoxo do PT e admite a necessidade de ajuste na Previdência. Esses acenos não convencem?

É aquela história. Você tem um funcionário fazendo corpo mole, dá uma chance para ele melhorar o desempenho e ele não se corrige. Aí você cansa, resolve demiti-lo e ele diz que agora vai mudar completamente. Dá para acreditar? 

Mas os petistas não estão fazendo corpo mole. Eles estão na oposição agora.

O programa de governo que eles apresentaram faz um diagnóstico errado e aponta na direção errada. Agora, a duas semanas da eleição, o candidato sugere que vai ser diferente. Como acreditar? Não vai funcionar.

Se o programa apresentado na campanha aponta o caminho errado e depois o presidente quer mudar, precisa ser um deus para mover o partido, a base de apoio no Congresso, em outra direção. Foi o que Dilma tentou fazer após ser reeleita em 2014. Não deu.

Em 2002, Lula deu uma guinada, se elegeu e foi bem sucedido.

A diferença é que a situação da economia é muito pior hoje e o PT está no caminho oposto. Na campanha de 2002, Lula mudou a direção do partido meses antes da eleição e logo começou a buscar interlocução com o governo Fernando Henrique Cardoso. Não é o que ocorre agora.

O ajuste que o próximo presidente precisará fazer não será fácil. Ele terá que cortar gastos e não poderá aumentar suas receitas, porque a sociedade não aguenta mais a carga tributária. Não vejo o PT preocupado com isso. É difícil dar a eles o benefício da dúvida.

Bolsonaro é convincente para os investidores?

Ele diz claramente que há um problema, desde o início da campanha. Apresentaram um programa de governo, e agora sua equipe está discutindo os detalhes.

O que se vê ao redor dele é uma confusão. Os filhos não se entendem com o vice, o general Hamilton Mourão, e todos desautorizaram Paulo Guedes quando seu plano para os impostos veio à tona. Como confiar? 

A turma envolvida com eles é de primeiríssima linha. Sabem exatamente o quê e como fazer. A equipe ainda está em formação, aprendendo a trabalhar junto.

De quem o sr. está falando?

Guedes é o único assessor que aparece em público, mas tem evitado debates e entrevistas. Sim, mas é normal. Ele já disse publicamente que há entre 30 e 40 pessoas com ele.

O sr. os conhece?

Conheço. Estive com vários. Vimos a evolução deles. Tinham um plano mais conceitual lá atrás e agora estão formulando propostas, conversando com a Fazenda. É uma construção. 

Pode nomear alguém?

Prefiro não falar. Mas tive contato com várias dessas pessoas, e todas são muito boas. Não tem dono da verdade. Estão em busca da melhor solução. 

Bolsonaro teria apoio no Congresso, sem ter partido forte nem aliados? 

Quando a pessoa diz que o Brasil tem esse problema e é eleita com um programa para resolvê-lo, é muito difícil para o Congresso dizer não. Todos sabem que temos um problema nas contas públicas. O Congresso sabe.

A revista The Economist afirma que Bolsonaro é uma ameaça à democracia.

O receio é meritório, mas é uma questão de opinião. Não acredito em rompimento das regras do jogo democrático. Está para nascer a pessoa que conseguirá fazer isso. O Congresso não vai deixar. É só lembrar o que aconteceu nos governos do PT. 

A que o sr. se refere? O general Mourão chegou a admitir a possibilidade de autogolpe. O PT nunca sugeriu algo parecido.

Tentaram restringir a imprensa, ameaçaram tomar várias medidas de controle. Nada foi para frente, porque o Congresso não permitiu. E como alguém que é parlamentar há 20 anos, como Bolsonaro, pode ser considerado antidemocrático? 

Cada candidato no fim é uma espécie de caricatura. Sempre tem muito exagero no que as pessoas falam na campanha. E tem também o que a oposição faz para colocar um selo na pessoa, dizer que ela é assim ou assado. O que a pessoa será, a gente vai ver.

O PSDB também aponta o perigo de uma guinada autoritária. O mercado subestima esse risco?

Todos sabem muito bem quais são os problemas que estamos enfrentando e os preços já embutem um prêmio substancial de desajuste, de descontinuidade. O mercado já projeta a necessidade de uma alta dos juros lá na frente. O risco de um governo Bolsonaro é bem pequeno. 

Uma vitória da direita enfraqueceria forças políticas de centro como o PSDB. Ele fará falta?

Votei no PSDB minha vida inteira. Se ficarem fora do segundo turno e apoiarem o PT, nunca mais votarei neles. Desde o fim do governo Fernando Henrique, o partido só nos surpreendeu negativamente. Nunca foi oposição de fato e votou contra coisas que sempre defendeu. 

Se ele perder expressão e for engolido agora, é porque não fez a coisa certa. Mas o buraco será preenchido de alguma maneira. Parte da população que não se identificava com os tucanos na oposição se identificou com Bolsonaro. Ele soube ocupar esse espaço.

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