‘Berçário’ do rio São Francisco seca ‘Berçário’ do rio São Francisco seca e deixa três milhões de peixes mortos

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A cena é dantesca. No leito seco da Lagoa Itaparica, a maior lagoa marginal do rio São Francisco, peixes e mais peixes mortos estendem-se pelo chão. Barcos e canoas encalhadas compõem o cenário do que antes era um grande espelho d’água onde nadavam surubins, curimatãs e dourados.

Com 2.200 hectares de extensão, a lagoa fica dentro de uma área de proteção ambiental entre os municípios de Xique-xique e Gentio do Ouro, na região norte do Estado da Bahia. É alimentada por pequenas nascentes da região e pelas águas do São Francisco que chegam por um canal de cerca de 20 km.

Em quatro décadas, a lagoa secou apenas quatro vezes. A penúltima delas foi em 2015. A última há duas semanas, quando deixou um rastro de cerca de três milhões de peixes mortos, segundo cálculo inicial do Ibama. “É um desastre ecológico”, resume Anivaldo de Miranda, presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco.

Por ter águas tranquilas, mornas e protegidas, o lago é considerado um dos principais “berçários” do Velho Chico. Ali, reproduzem-se grande parte das espécies nativas de peixes do rio, desde o tradicional surubim até o pirá, hoje considerado praticamente extinto na região do médio São Francisco.

“Os peixes desovam, os filhotes ficam lá crescendo e um ano depois seguem para o rio em grande quantidade. Com a lagoa seca esse ciclo é interrompido”, afirma Vanderlei Pinheiro, engenheiro de pesca e analista ambiental do Ibama.

Desta forma, o impacto não ficará restrito às 2.000 famílias de ribeirinhos que vivem em torno da lagoa. Todo o trecho do rio desde Minas Gerais até a barragem de Sobradinho, próximo a Juazeiro, na Bahia, será afetado.

DEVASTAÇÃO

A seca da lagoa é resultado de uma confluência de problemas hídricos e climáticos. O assoreamento é o mais visível: o lago que chegou a ter até seis metros de profundidade nos últimos anos não tem mais do que um metro. A devastação da vegetação nativa que deu lugar a pastos onde são criados porcos também fez a terra ceder em diversos pontos.

O problema é potencializado pela baixa vazão do rio São Francisco e pela seca de seis anos consecutivos que atinge a região Nordeste.

Na região de Xique-xique não chove há seis meses, cenário que fez aumentar a evaporação do espelho d’água da Lagoa Itaparica. Em condições normais, a lagoa tem uma evaporação de 2.400 milímetros de água por ano. Mas recebe apenas 600 milímetros de chuva. Sem a contribuição de água do rio São Francisco, a conta não fecha.

Além da degradação das margens da lagoa e do canal que a abastece, a pesca predatória também é um dos mais graves problemas enfrentados por Itaparica. Por ser uma região de reprodução, é proibido o uso de redes de arrasto.

Mesmo assim, a região foi por anos alvo de empresários do ramo pesqueiro que arrendavam terras no entorno da lagoa para produção em larga escala. “Eles praticamente coavam a lagoa”, afirma Pinheiro, do Ibama. Segundo ele, o ideal é que a lagoa atenda apenas a pesca de subsistência dos ribeirinhos.

SOS LAGOA

Diante da seca da Lagoa Itaparica e mortandade de milhões de peixes, um plano de ação emergencial foi definido para tentar reverter o quadro. Batizado de “SOS Lagoa Itaparica”, inclui Ministério Público, comitê de bacia, prefeituras e órgãos federais e estaduais. Estão previstas ações de monitoramento da lagoa, além de fiscalização e mapeamento dos impactos causados à população ribeirinha.

O Ibama propôs ações de recuperação da vegetação e desassoreamento do canal que abastece a lagoa. As restrições orçamentárias, contudo, seguem sendo um obstáculo para concretizar os projetos.

AÇÃO IMEDIATA

Sem uma ação imediata, dizem os especialistas, estará comprometido o futuro da lagoa e do próprio rio São Francisco, que vive uma de suas principais crises hídricas de sua história. “A seca da lagoa é grave, mas é apenas um sintoma, uma consequência de um problema muito maior”, diz a promotora Luciana Khoury, do Núcleo do Rio São Francisco do Ministério Público do Estado da Bahia.

Ednaldo Campos, do comitê de bacia do São Francisco, cobra urgência nas ações de revitalização: “Se não agirmos rápido, eventos como a seca da lagoa serão cada vez mais recorrentes e traumáticos”.  As informações são de JOÃO PEDRO PITOMBO, Folha de São Paulo.

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