Olimpíadas: Kelvin Hoefler é prata no skate e conquista primeira medalha do Brasil em Tóquio

Kelvin Hoefler comemora na final olímpica do skate street: medalha de prata para o Brasil Foto: MARTIN BERNETTI / AFP

A primeira medalha do Brasil nos Jogos Olímpicos veio exatamente em um esporte estreante — e onde o país é potência. Kelvin Hoefler, que já foi hexacampeão mundial, já havia admitido que competir neste nível é algo diferente, o que só aumenta ainda mais o brilho da prata conquistada. Com 36,15 de nota total, só foi superado pelo japonês Yuto Horigome, que fez voltas perfeitas e ficou com o ouro com 37,18 no início da madrugada de hoje. O bronze ficou para o americano Jagger Eaton, com 35,35.

Kelvin vibrou com as duas primeiras voltas. E mandou beijinho na terceira tentativa mesmo não completando uma manobra. O paulista, que usa fone de ouvido mas não escuta músicas, disse que estava concentrado. E que este é um artifício para ficar tranquilo e isolado, ninguém o procura. O brasileiro ficou a final inteira ao lado de Pamela Rosa, que assitiu a prova embaixo de um grande guarda sol em área restrita.

A disputa seguiu acirrada e os skatistas pareciam se divertir mesmo no calor desconfortável da arena. Faziam gestos a cada manobra concluída para a imprensa, organizadores e colegas que assitiam à decisão. A torcida dos jornalistas embalou os atletas. E eles curtiram.

O brasileiro largou bem, mas na quarta volta entrou pressionando após o 9,5 de Horigome. Tinha de fazer 9,1 para assumir de novo a liderança. Com 7,58 caiu para a terceira colocação.

Ele reclamou do vento e do sol, “feroz” às 12 horas em Tóquio. Mas mostrou-se extremamente feliz.

—Se não fosse o vento, a gente poderia ter levado. Infelizmente, eu errei duas manobras ali por conta do vento.  Essa medalha aqui, eu acredito que é um ganho para o skate em geral do Brasil, sabe? A gente vem batalhando e é bem difícil. Isso aqui eu acredito que ainda é pouco pelo que a gente vem trabalhando. Isso aqui não é só meu. Isso aqui é de todos os skatistas do Brasil, de toda a galera que vem torcendo pela gente.

No fim, a volta final definiu a prata. E ele comemorou ainda na pista.

— Essa medalha aqui, eu acredito que é um ganho para o skate em geral do Brasil, sabe? A gente vem batalhando. É bem difícil a modalidade no Brasil, então eu cresci tendo muitas dificuldades. Isso aqui eu acredito que ainda é pouco pelo que a gente vem trabalhando. Isso aqui não é só meu. Isso aqui é de todos os skatistas do Brasil, de toda a galera que vem torcendo pela gente.

O currículo de Kelvin fala por si só. Hexacampeão mundial, bicampeão do X-Games e considerado o principal nome do país na modalidade street.

Kelvin Hoefler, de 27 anos, entrou na pista do Ariake Sports Urban Park como atual número 4 do mundo, e saiu como medalhista olímpico. Ele andou lesionado — no primeiro dia, caiu durante um treino e machucou as costelas e as mãos.Reclamação das notas

A lição dessa estreia? É preciso colocar o skate em lugar fechado. Com o sol a pino, às 12h, a arena não ficaria cheia mesmo se o público estivesse liberado. Muito quente e desconfortável — para quem competiu e para quem trabalhou e assistiu.

Além do fator novidade por ser um dos esportes estreantes nestes Jogos Olímpicos, o skate chamou a atenção pelas notas aplicadas — e pela falta de entendimento do público e dos skatistas sobre o que vale uma pontuação alta. A cena mais marcante foi protagonizada pelo japonês Sora Shirai, que fez uma série na bateria 1 que arrancou aplausos do público e da crítica especializada. A nota, porém, foi apenas 7.99. O japonês não escondeu a insatisfação.

Esportes com jurados não são novidade e são marcados por confusões. No surfe, por exemplo, a avaliação é sobre estilo, variedade e inovação. A ginástica artística também já foi palco de diversas contestações pelas acrobacias com alto grau de dificuldade que não renderam os pontos esperados. Ou seja, o skate não escapa.

Disputa até o fim

Kelvin começou muito bem a final olímpica, assumindo a liderança com notas 8,98 e 8,84 nas duas primeiras saídas. A partir daí, começou a brilhar a estrela do japonês Yuto Horigome, de 22 anos, que encaixou quatro notas acima de 9 nas cinco últimas tentativas.

Já o brasileiro, depois de fazer outra ótima descida com um 8,99, caiu duas vezes na parte decisiva e emplacou um 7,58 na sequência, chegando à terceira colocação. O americano Jagger Eaton, com um 9,40 – que era a melhor nota até a penúltima tentativa de Horigome, quando o japonês fez 9,50 — , subiu até a segunda colocação.

Na última tentativa, Kelvin marcou 9,34, sua melhor nota, e ultrapassou Eaton. Sob pressão, o americano caiu na última tentativa e acabou terminando com o bronze.

Em entrevista ao GLOBO em 2019, quando treinava para disputar vaga na Olimpíada de Tóquio, Kelvin relatou que sua postura fugia do estereótipo que se tem de skatistas:

—  Nunca bebi, nunca fumei. Nem costumava andar com a galera. No skate ou você é “lifestyle”, fazendo vídeos e andando relaxado, ou é focado em competição, treina, tem a hora certa de comer, de ir na academia. Eu me encaixo nesse segundo grupo — disse Kelvin à época, e comentando ainda que sentia-se olhado de forma estranha por alguns colegas por conta de sua postura.

Antes de se tornar um dos melhores skatistas do mundo na categoria street, Kelvin tentou praticar surfe e futebol. Como não gostava de água fria, seu pai chegou a comprar uma roupa emborrachada para o filho surfar, mas foi outra prancha que atraiu o gosto do jovem atleta.

Foi também incentivado pelo pai que Kelvin começou a andar de skate, aos 8 anos, em uma pista improvisada dentro de casa, no Guarujá, litoral paulista: uma mini rampa com alguns obstáculos, que ia da cozinha até a garagem.

O Globo

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