Ministra da Agricultura afirma que demarcações de terras indígenas não serão afetadas

Ministra Tereza Cristina (Agricultura) durante a posse do presidente Jair Bolsonaro

Depois de ignorar o tema dos índios em seu discurso de posse, a nova ministra da Agricultura, Tereza Cristina (DEM-MS), minimizou as críticas à mudança que dará à sua pasta a responsabilidade sobre a demarcação de terras indígenas. Até 2018, essa atribuição era da Funai (Fundação Nacional do Índio).

Em entrevista na saída do evento, em Brasília, ela negou que a ausência do tema em sua fala no palco fosse uma mostra de que o assunto será lateral em sua gestão.

“De jeito nenhum. Eu falei de maneira genérica sobre os assuntos fundiários. Todos eles são importantes”, disse nesta quarta-feira (2).

A pasta da Agricultura passará a abrigar o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), que será ligado à Secretaria Especial de Assuntos Fundiários. Segundo a ministra, a decisão do governo foi concentrar no ministério todas as questões fundiárias.

“Não vamos arrumar um problema que não existe. É simplesmente uma questão de organização”, afirmou ela, ao sustentar que as demarcações não serão afetadas. “Os assuntos fundiários, todos eles, estão vindo para o Incra.”
Joelmir Tavares e Angela BoldriniFolha de São Paulo

“A parte fundiária da Funai veio para o Incra. E toda a parte de políticas públicas para os indígenas vai ficar com o Ministério de Direitos Humanos”, disse.

Com as mudanças, as discussões sobre a identificação, delimitação e demarcação de terras indígenas no país vão passar pelo ministério da Agricultura, o que preocupa indigenistas e lideranças das comunidades.

“Quem é que vai desobedecer à Constituição?”, indagou Tereza, devolvendo a pergunta de uma jornalista que mencionou o direito constitucional dos índios sobre as terras.

A principal crítica é que as decisões ficarão nas mãos dos ruralistas, adversários dos interesses dos indígenas em diversos estados. A alteração de organograma foi confirmada em medida provisória assinada pelo presidente Jair Bolsonaro e publicada na noite desta terça-feira (1º), após poucas horas no cargo.

O secretário especial de Assuntos Fundiários, empossado também nesta quarta, será Luiz Antonio Nabhan Garcia, presidente da UDR (União Democrática Ruralista).

Depois de passarem pelo órgão, as demarcações serão discutidas em um conselho interministerial que o governo irá criar. “Esse conselho ainda está sendo decidido, para que as demarcações sejam feitas através dele”, disse Tereza.

“O governo está começando hoje”, relativizou ela. “Vocês têm que dar um tempinho para a gente”, falou aos repórteres.

Nabhan disse à Folha, antes da cerimônia, que o conselho funcionará como uma instância deliberativa. Nele haverá, de acordo com o secretário, representantes de cinco ministérios: Agricultura, Mulher, Família e Direitos Humanos, Meio Ambiente, Casa Civil e Gabinete de Segurança Institucional.

“Qualquer identificação ou demarcação vai ser submetida ao conselho. A palavra final mesmo será do presidente da República”, afirmou Nabhan, que foi conselheiro de Bolsonaro para o agronegócio durante a campanha eleitoral e esteve cotado para assumir o Ministério da Agricultura.

“Eu acho que está havendo uma precipitação”, opinou ele sobre a controvérsia. “Não tem como fugir dos processos técnicos e jurídicos”, continuou, ao falar que a legislação será respeitada.

“Nós precisamos começar a separar o joio do trigo: precisa ver se está havendo protestos de indigenistas ou daqueles que se dizem indigenistas, de ONGs que a vida inteira tiraram proveito [de convênios e repasses]”, afirmou Nabhan.

A nova ministra, na saída do evento, disse ainda que o agronegócio brasileiro protege o ambiente e que é preciso derrubar a pecha associada ao setor. No discurso, ela havia dito que o Brasil “é um modelo a ser seguido, jamais um transgressor a ser recriminado”.

“Nós temos que mudar essa imagem”, ressaltou. “O produtor brasileiro preserva. Nós temos leis ambientais muito firmes, que já mostraram que o Brasil tem 66% do seu território preservado.”

Ela defendeu que é necessário mostrar o que o Brasil “tem de bom”. Para os produtores “que fazem errado”, prosseguiu, deve haver punição. “E para isso está a lei.”

Tereza Cristina falou ainda que as exportações de carne para países árabes, que podem enfrentar problemas caso Bolsonaro concretize a proposta de transferir a embaixada do Brasil em Israel para Jerusalém, será um assunto discutido com outras instâncias do governo.

“Esse assunto será colocado, e o diálogo aberto. Recebi hoje aqui vários embaixadores do mundo árabe, muçulmano. A gente vai continuar essa conversa, esse diálogo, porque são muito importantes para os negócios brasileiros as exportações de carne.”

De acordo com a ministra, os representantes das nações que compram carne halal do Brasil “estão ansiosos para sentar numa mesa e começar o diálogo”. 

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