Militares falharam em não combater comunismo, diz Olavo de Carvalho

Caro conservador, não se engane: a esquerda pode estar cambaleante em tempos que consagraram o americano Donald Trump, o brasileiro Jair Bolsonaro (PSL), o britânico Brexit e os franceses “coletes amarelos”.

Mas quem é vivo sempre aparece, e, da mesma forma que não foi sepultado com a queda do Muro de Berlim, o marxismo pode voltar à cena se a direita não ficar esperta. Eis a tônica da primeira Cúpula Conservadora das Américas, promovida neste sábado (8) sob batuta do deputado reeleito Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), um dos filhos do presidente eleito.

Ícone máximo do dia, Olavo de Carvalho aparece no telão acendendo seu cachimbo de praxe, assoa o nariz, toma o gole do que parece ser um trago alcoólico e discorre sobre os pecados da esquerda, pelo que dá para entender de um discurso picotado por problemas técnicos.

Pouca gente compreende o que diz, a começar pela intérprete de Libras, que parece perdida em vários momentos. Em dado momento, sua esposa o informa que o público do outro lado do planeta não está escutando direito o que diz. Ele continua.

O que dá para ouvir: que Olavo, um dos totens do conservadorismo anabolizado no Brasil com a vitória de Jair Bolsonaro, autor de “O Mínimo que Você Precisa Saber para Não Ser um Idiota”, está preocupado. Anna Virginia Balloussier – Folha de São Paulo

Reaviva o fantasma do comunismo: “Vocês não têm ideia do que é KGB, da magnitude do inimigo. É capaz de fazer picadinho de qualquer partido [conservador] em dez minutos”.

Para ele, que vive nos EUA, o regime militar pecou ao não investir nas chamadas guerras culturais. Não produziu, por exemplo, cartilhas anticomunistas, afirma Olavo enquanto sua mulher prepara coquetéis no fundo da cena.

O problema, segundo Eduardo, admirador do coronel condenado por tortura Carlos Alberto Brilhante Ustra, é que a ditatura só se ocupou de dar cabo da guerrilha. “O outro lado continuou solto.”

“Ai, deixa eu tirar uma fotinho bem bacana”, diz uma monarquista de Cascavel (PR) que se identifica como Nani Napoleão, idade não revelada. Com uma camisa onde se lê “direita concentrada” nas costas (na frente, os rostos de Bolsonaro e seu vice, o general Antonio Hamilton Mourão) empolga-se ao avistar um legítimo herdeiro da família real brasileira.

Deputado eleito pelo PSL, o “príncipe” Luiz Philippe de Orleans e Bragança, outrora possibilidade de vice de Bolsonaro, está no rol de palestrantes que falarão no primeiro debate do dia: ele, Olavo de Carvalho, Orlando Gutierrez, um doutor em filosofia que está ali para representar os exilados cubanos nos EUA, e Roderick Navarro, venezuelano do grupo Rumbo Libertard, oposição a Nicolás Maduro.

A maioria ali, como Nani, se diz se saco cheio de anos de monopólio esquerdista no campo intelectual. Há o momento oficial para formar filas e tirar foto ao lado de Bolsonaro, em frente ao painel do evento patrocinado pela Fundação Índigo, do PSL.

O coaching e historiador Marcelo Frazão, 50, conta que abandonou a carreira universitária por se sentir perseguido por causa de sua ideologia destra. Exemplo: acha que o conceito de ditadura de direita é balela. Há, isso sim, “movimentos militares que reagem à expansão do socialismo”, argumenta.

“Todas as ditaduras são de esquerda marxista”, afirma, incluindo nesse pacote do italiano Benito Mussolini ao espanhol Francisco Franco. “Mussolini era um marxista desde que nasceu.”

Ora, argumentam os ali presentes: se a esquerda tem o Foro de São Paulo, o Fórum Social Mundial e toda a sorte de antro comunista, estava mais do que na hora dos conservadores criarem seu próprio espaço de pensamento, com “pessoas de bem”, dispostas a abraçar o slogan bolsonarista por excelência: “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”.

“A América Latina está junta para dizer não ao socialismo, não ao Foro de São Paulo. Não seremos a próxima Venezuela”, diz Eduardo Bolsonaro na abertura do evento, realizado no salão de um hotel de Foz do Iguaçu (PR), sua mãe, Rogéria Bolsonaro, na primeira fila com um imponente penteado loiro.

A cidade é famosa por suas cataratas e agora, brincam na plateia, por outro tipo de enxurrada, a conservadora. Na rede de wi-fi, uma das conexões foi batizada de “petista não é gente”. Numa arara, produtos da marca Camisetas Opressoras (do irônico mote “muito mais opressão”) à venda, uma delas com os dizeres “Olavo tem razão”.

Também estão lá o presidente do PSL, Luciano Bivar, o advogado do partido Gustavo Kfouri e Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), deputado reeleito com apoio do pastor Silas Malafaia. Outras mesas previstas para mais tarde contariam com um senador paraguaio sequestrado por guerrilheiros de esquerda, Fidel Zavala, o ex-presidente colombiano Álvaro Uribe e Miguel Angel Martín, que já presidiu a corte suprema venezuelana e hoje está exilado nos EUA.

Bivar avisa que tem “apenas uma coisa a dizer”: “Esse encontro está um pouco atrasado, mais ou menos 28 anos”. Afinal, eis “a grande verdade”: “Falar de liberalismo era algo fora de contexto, sobretudo para cientistas sociais da América Latina”. Tem que mudar isso aí, tá ok?

Antes da mesa inaugural, a plateia assiste a um trecho de um documentário, “As Raízes do Problema”, que joga no colo da Escola de Frankfurt, que reuniu pensadores como Theodor Adorno, a responsabilidade de atacar a educação aprendida em casa, com os pais, e na igreja, por exemplo. Tudo em nome da “utopia comunista”.

Solo fértil para Jacques Derrida e sua teoria desconstrutivista. Dá para ressignificar da Bíblia (transmutado num livro para impor a superioridade de uma raça ou de um sexo) a William Shakespeare (misógino). Seria a praga do relativismo cultural, que atende a uma agenda política de esquerda, conforme a tese do filme.

No filme, o escritor David Horowitz, um conservador convertido após atuar por anos como ponta de lança da Nova Esquerda americana, define o embate entre progressistas e conservadores como uma luta entre Godzilla e Bambi. “Nos chamam de racistas, sexistas, homofóbicos, imperialistas. Nós os chamamos apenas de… liberais [nos EUA, selo para progressistas]”.

Do Brexit aos protestos dos “coletes amarelos” na França, e obviamente a eleição de Donald Trump, são muitos os sintomas de uma onda conservadora, afirma Orleans e Bragança —alguém que, “como eu, carrega um sobrenome indissociável”, brinca Eduardo Bolsonaro.

“O comunismo fere a natureza humana”, diz Gutierrez, que parece contente ao ouvir Eduardo dizer que adoraria que o Brasil sediasse um tribunal para crimes cometidos pelo regime cubano.

Navarro diz que “a verdadeira oposição venezuelana é uma resistência composta por civis e militares”. E uma frente por excelência anticomunista e conservadora em seus valores. Hermana, portanto, do movimento que saiu fortalecido das urnas brasileiras.

“Vira e mexe a gente escuta alguém falando em regulamentação da internet”, diz o filho de Bolsonaro, eleito presidente com uma campanha sob suspeita de usar uma oferta ilegal de mensagens de WhatsApp.

Seria um “tema temerário”? Joga a pergunta para Orleans e Bragança.

“Completamente contrário”, responde o “príncipe”, que atenta ao “direito fundamental da liberdade de expressão”. Ele lembra de Cuba, China e Coreia do Norte, uma trinca que controla com mão de ferro o acesso de sua população à internet. “É muito fácil bloquear textos seletivos, internacionais.” Assim o pensamento divergente sufoca, diz.


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