MEC não fiscaliza bolsas de estudo que dão isenção fiscal, diz auditoria

Avião que fica em unidade de instituição educativa no Distrito Federal suspeita de irregularidades com bolsas

O TCU (Tribunal de Contas da União) constatou que, embora certifique escolas para receber isenções fiscais de até R$ 4,5 bilhões por ano, o Ministério da Educação não fiscaliza o cumprimento das contrapartidas sociais exigidas pela legislação.

Auditoria da corte constatou que a pasta não tem banco de dados que possibilite conferir se bolsas foram concedidas na quantidade exigida e se os beneficiados são realmente carentes.

A inércia do ministério favorece as fraudes na concessão de descontos nas mensalidades. Além do descumprimento de critérios de renda para a oferta de descontos em mensalidades, a fiscalização descobriu, por exemplo, 1.500 casos em que um mesmo bolsista foi declarado três ou mais vezes, no mesmo ano, pela mesma entidade. Em situações extremas, um só nome estava seis vezes na lista.

Como revelou a Folha no último dia 5, universidades e instituições de ensino básico com selo de beneficentes declaram ter bolsistas supostamente de baixa renda, mas que aparecem em cadastros oficiais como donos de lancha, carro de luxo e até avião. As informações são da Folha de são Paulo.

A suspeita de auditores do TCU é de que as relações de beneficiados sejam manipuladas pelas entidades.

A legislação exige, por exemplo, que as entidades, detentoras do Cebas (Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social), concedido pelo ministério, destinem 20% de seu faturamento bruto para gratuidades no ensino básico.

A auditoria mostra que as escolas, em alguns casos, enviam ao MEC dados que nem sequer permitem identificar quem são contemplados com descontos em mensalidades.

“Não há conferência alguma [do ministério] sobre a listagem nominal de bolsistas, sendo verificado apenas o quantitativo de bolsas que a entidade pretende ofertar”, afirma relatório do TCU.

O tribunal também identificou falta de controle sobre o perfil das instituições beneficiadas. Para ter direito a isenções tributárias, elas não podem visar ao lucro e distribuir dividendos. Há também restrições quanto ao valor de salários pagos aos dirigentes.

O objetivo é evitar que a filantropia subsidiada pelo governo sirva para enriquecimento de particulares.

O TCU apurou que o MEC, na prática, recebe documentos das entidades para certificá-las, mas não tem instrumentos para verificar se as informações são verdadeiras.

Após a certificação, por exigência legal, elas têm de apresentar uma prestação de contas anual das atividades. Na prática, no entanto, a maioria descumpre a regra.

Em 2016, 6% das entidades com Cebas tinham a documentação registrada no sistema eletrônico do ministério; nos dois anos anteriores, menos de 0,3%. “Dos relatórios enviados, nenhum foi analisado pelo MEC”, apurou o Tribunal de Contas.

LENTIDÃO

A auditoria diz também que o governo é lento para decidir se renova a certificação de entidades que já têm o selo de beneficentes.

Um decreto federal fixa um prazo de seis meses para que a análise seja concluída, mas o ministério levou, em média, 58 meses para fazê-lo em processos que, ao fim, a prorrogação foi negada.

O principal problema nesses casos é que as instituições só perdem as isenções após a decisão final. Quanto mais atraso, mais arrecadação o governo perde. “Essas entidades usufruíram de uma imunidade tributária a qual não teriam direito se a análise ocorresse no prazo legal”, sustenta o TCU.

Também há indícios de que escolas sem o Cebas continuem desfrutando de benefícios. A Receita informou que 1.484 usufruíam da isenção tributária em 2015, mas, segundo o MEC, só 1.239 tinham certificação para isso.

OUTRO LADO

O MEC informou que tem informações de bolsistas e das respectivas instituições que concederam bolsas, mas não “de forma estruturada”. Em nota, afirma que “a gestão anterior não deixou um sistema que pudesse suprir as necessidades da demanda do programa”.

Para superar as “eventuais fragilidades dos mecanismos de controle”, a pasta diz que está construindo um sistema informatizado, que permitirá um cruzamento com outras bases de dados.

Apesar disso, o órgão afirma que a veracidade das informações cabe às instituições de ensino. “Isso não significa, porém, que o MEC se furte à responsabilidade de conduzir as análises dos processos de certificação, renovação e supervisão das entidades beneficentes com o rigor necessário”, diz.

Para evitar que bolsas sejam concedidas para donos de avião, por exemplo, o MEC diz que está em “tratativas” com a Receita Federal para compartilhar informações que serão usadas no processo de certificação.

O MEC diz ainda que deu encaminhamento a alterações do marco legal vigente para “permitir ao órgão atuar sobre os procedimentos de seleção de bolsistas”.

Sobre a demora no prazo de renovação dos certificados, o MEC informa que “um conjunto expressivo ​de medidas gerenciais orientadas para aprimoramento gerencial da política de certificação vêm sendo adotadas sobretudo ao longo dos últimos cinco anos”.

O resultado, ainda segundo a pasta, é que estão pendentes de análise só 24% dos mais de 9.450 processos protocolados no MEC. A previsão é de conclusão do estoque no decorrer do presente exercício, adequando o tempo de análise para 180 dias.

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