Bispos nos EUA pedem perdão por escândalo de abusos sexuais

Igreja de St. George's organizou uma 'Missa de Reparação', em que bispo pediu desculpas sobre acusações de abuso sexual contra crianças Foto: Monica Jorge / New York Times
Igreja de St. George’s organizou uma ‘Missa de Reparação’, em que bispo pediu desculpas sobre acusações de abuso sexual contra crianças Foto: Monica Jorge / New York Times

Quando a arquidiocese de Hartford, no estado americano de Connecticut, soltou, neste ano, uma lista com 48 padres acusados de abuso sexual, cinco deles tinham servido na mesma igreja: a St. George, na pequena cidade costeira de Guilford.

Na ocasião, alguns membros da grande congregação ficaram consternados; outros se enfureceram, afirmando que sua fé nos homens que lideravam a igreja começava a definhar depois da enxurrada de acusações.

O arcebispo de Hartford, Leonard P. Blair, respondeu à crise com um gesto pouco usual: uma grande Missa de Reparação. Afirmou então que vinha diante da congregação “de joelhos, enquanto bispo” em busca do perdão.

— Eu peço perdão a Deus, à comunidade em geral e à nossa comunidade católica — disse ele, diante de uma igreja lotada, usando as vestimentas tradicionais dos bispos. — Eu peço especialmente por todas as vítimas de abuso sexual e suas famílias. Peço por tudo que as lideranças na Igreja fizeram ou falharam em fazer.

Bispos por todas as partes dos EUA estão sendo acusados de encobrir, por décadas, abusos sexuais cometidos por sacerdotes contra crianças.

Esses mesmos bispos americanos, no entanto, têm feito uma campanha de desculpas, normalmente usando termos pessoais, enquanto a Igreja Católica peleja contra as consequências de um escândalo que tem movido investigações e minguado a fé de seus seguidores. Alguns deles, como o arcebispo Blair, realizaram missas de reparação como a de Guilford. Eles ofereceram mensagens conciliatórias em sermões e em cartas, como a do cardeal Joseph W. Tobin, arcebispo de Newark, que expressou sua “genuína tristeza e arrependimento às vítimas que confiaram em membros da Igreja e foram traídos”.

O escândalo cresceu depois que o procurador-geral da Pensilvânia divulgou um grande relatório judicial em 2018 detalhando não apenas sete décadas de acusações, mas também as tentativas dos líderes da Igreja para impedir as vítimas de denunciar os abusos e afastar as autoridades da investigação. Esse primeiro gesto foi seguido por mais autoridades estaduais e federais anunciando suas próprias investigações.

Brasil é exemplo

A Igreja Católica tem sido abalada por escândalos de pedofilia que surgiram também na Europa, no Chile, na Austrália e no Brasil. Por aqui, o bispo da Diocese de Limeira (SP), dom Vilson Dias de Oliveira, está sob investigação do Ministério Público e do próprio Vaticano por suspeita de extorsão, coação e acobertamento de casos de pedofilia e abuso sexual pelo padre Leandro Ricardo, que nega as acusações e foi afastado da Basílica de Americana em janeiro. Dom Vilson não comentou as denúncias.

Após as primeiras acusações brasileiras virem à tona, fontes da Santa Sé disseram ao GLOBO que o caso de Limeira será usado pelo Vaticano como exemplo da sua nova política de “tolerância zero” com pedofilia e desvios. Após o início das investigações, a Igreja realizou encontro histórico no qual expôs ao alto clero suas diretrizes de combate a esse tipo de crime.

Durante reunião que durou quatro dias, o Papa Francisco disse que a Igreja deveria tomar “medidas concretas” para resolver o problema em vez de se limitar a simplesmente condenar verbalmente os culpados.

Em Guilford, cidade de 20 mil habitantes, quatro dos cinco membros do clero acusados de abuso na igreja St. George estão mortos; um foi removido do ministério em 2010 e destituído no ano passado. Ainda em 2018, o arcebispo Blair disse que divulgaria os nomes dos padres acusados desde 1953, quando a arquidiocese foi formada. A maior parte dos supostos abusos ocorreu nas décadas de 1970 e 1980, bem antes da chegada de Blair, em 2013.

Carol Serfilippi, uma antiga congregada em St. George, viu um nome que reconheceu na lista de abusadores. Ela parou de frequentar St. George por um tempo depois que surgiram acusações, optando por assistir à missa em um mosteiro nos arredores da cidade. E apontou para os sacramentos como a principal razão pela qual permaneceu católica:

— A razão pela qual estamos aqui é a eucaristia, o Corpo de Cristo, que é importante para todos nós.

Ainda assim, a confiança nos bispos e outros líderes da Igreja foi bastante golpeada. Uma pesquisa feita pela Gallup sobre católicos americanos, divulgada em janeiro, descobriu que o número de pessoas que classificaria a honestidade dos líderes da Igreja como “muito alta” ou “alta” está em um nível historicamente baixo.

Várias tentativas recentes — algumas sutis, outros menos — mostram como a Igreja está tentando restaurar seu relacionamento com seus seguidores, além de publicar os nomes de sacerdotes que haviam sido acusados de abuso como um passo em direção à transparência e à prestação de contas.

Em uma missa dominical no Santuário Nacional da Imaculada Conceição, em Washington, um padre levou os fiéis a fazer uma oração pelas vítimas de abuso. A Catholic TV, canal dedicado à programação católica, transmitiu uma cerimônia religiosa de 12 horas descrita como “apenas uma oferta minúscula” de oração e penitência, parte de uma campanha maior chamada “Together we rebuild” (Juntos, reconstruímos, em português), que vai durar um mês.

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