‘Aqui não tem amador’, diz Moreira Franco sobre operação no Rio

O ministro Moreira Franco, em entrevista em seu gabinete

Um dos idealizadores do plano de intervenção federal no Rio de Janeiro, o ministro Moreira Franco (Secretaria-Geral) afirmou à Folhaque o governo fez um cálculo político consciente e assumiu riscos ao nomear um interventor militar para chefiar a segurança pública do Estado.

“Aqui não tem amador”, disse Moreira. “Nessas circunstâncias, não dá para ficar empinando pipa.”, segundo informações de Marina Dias – Folha de São Paulo.

Na avaliação do ministro, que governou o Rio de 1987 a 1991, a violência no Estado não foi controlada pelo Ministério da Justiça ou pelas autoridades locais e, por isso, o presidente Michel Temer precisou “agir com coragem”.

Irritado com o que chama de “deformação na análise dos fatos”, o ministro rechaçou que tenha havido intenção eleitoral de Temer ao trocar o debate sobre o fracasso da reforma da Previdência pelo da segurança, com muito mais apelo popular.

Folha – Por que decretar intervenção federal na segurança do Rio neste momento?

Moreira Franco – A violência no Rio vem crescendo há décadas. No governo do presidente Michel Temer, algumas operações de GLO [Garantia da Lei e da Ordem] foram feitas no Estado –os militares dão apoio às operações dos órgãos de segurança. Só que essas operações não surtiram o efeito necessário. E, no Carnaval, as coisas chegaram a um ponto de desordem. O carioca foi capturado pelo crime organizado.

O senhor está falando das operações das quais o Exército participa desde julho de 2017, ajudando na segurança?

Ajudando e não deu certo.

A intervenção federal não mostra que esse primeiro movimento falhou?

A GLO é uma operação de apoio que não deu resultado porque a inteligência funcionou precariamente. O comando era das autoridades locais e toda a questão operacional não tinha um comando único. Este método se demonstrou insuficiente.

Há uma rotina de crime nas favelas que vitimiza crianças quase que diariamente no Rio. A intervenção federal resolverá esse problema?

Não da noite para o dia.

O governo espera ver melhoras imediatas em quais áreas?

Temos que dar algum tempo ao interventor, que está trabalhando na estruturação de um plano e, evidentemente, vamos ter resultados positivos porque foi uma decisão técnica. Não é uma intervenção militar, é civil. O militar está no processo porque detém conhecimento da área.

O senhor e o ministro Raul Jungmann (Defesa) foram os idealizadores do plano e escalados para convencer o governador Luiz Fernando Pezão (MDB) sobre sua necessidade. Como foi o debate?

A percepção da exigência de ter que tomar uma medida mais severa foi do Temer. Nesse período do Carnaval a cidade ficou solta, não tinha ordem urbana.

O prefeito Marcelo Crivella (PRB) e o governador não estavam na cidade. Contribuiu?

Isso é um detalhe sobre o qual preferia não opinar. A partir da terça-feira de Carnaval (13) foi-se buscando áreas técnicas até que a concepção ficou pronta, aí buscou-se a área econômica. O que for necessário para o sucesso da operação terá que ser posto, porque não é só uma questão de policiamento na rua, tem que ter inteligência.

Quanto vai custar a intervenção até 31 de dezembro e de onde virá o dinheiro?

Não sei. O que for necessário terá que ser posto. Por isso que se chamou a Fazenda e o Planejamento. Eles vão ter que resolver isso.

O interventor Walter Braga Netto afirmou que a situação do Rio não é tão ruim e que a imagem da crise é afetada pelo noticiário. Concorda?

Para o cidadão, o que importa é a percepção e ela era a pior possível.

Braga Netto disse que começará a planejar só agora, depois de decretada a intervenção, a estratégia. Não tinha que ter feito isso antes?

Isso é natural. Ele vai dizer que vai pensar, que vai ver, que vai formular. Você acha que o Comandante Militar do Leste, que foi da inteligência durante muito tempo, não tem uma noção? Tem, agora ele não vai ficar dizendo.

Então há uma estratégia mantida em sigilo por segurança?

Prefiro usar a palavra cautela. Por que vou dizer ao adversário o que eu vou fazer?

Acredita que, ao federalizar a crise de segurança no Rio, outros Estados poderão cobrar as mesmas medidas?

Institucionalmente, Temer já anunciou a criação do Ministério da Segurança Pública. A experiência com regimes ditatoriais obnubilou a percepção sobre segurança. Há um desarranjo social.

E o Ministério da Justiça não foi capaz de organizar? Será preciso um novo ministério?

Se fosse capaz de resolver, não estaríamos conversando.

O ministro da Justiça, Torquato Jardim, vai aceitar ficar com um cargo tão esvaziado, sem o controle da Polícia Federal?

Sua percepção de poder está pouco institucional e muito fulanizada.

Torquato teve algum papel na decisão sobre a intervenção?

Toda a configuração legal foi ele que deu.

E ele vai ficar no cargo?

Por que não? Vai servir ao país, melhorar e enfrentar um problema para o qual tem que se ter uma solução.

Qual é o perfil desejado para esse desse novo ministro de Segurança Pública?

Não participamos ainda de discussão sobre nomes.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ficou irritado por ter sido comunicado sobre a intervenção federal no Rio somente com o plano pronto. Por que não foi avisado antes?

Para se chegar à parte política, foram ouvidos especialistas, ministérios das áreas e, na medida em que cada etapa era vencida, chamava-se a subsequente. Maia manifestou-se [irritado], mas não foi uma coisa para esvaziar o debate para ele.

A intervenção no Rio foi uma decisão arriscada para Temer, porque no primeiro problema, ele será culpabilizado. O governo fez esse cálculo?

Aqui não tem amador. As pessoas têm 50, 45, 40 anos de vida pública. Claro que fez.

E qual é o cálculo?

O cálculo é que na vida, tem certas horas, que você tem que assumir riscos, tem que decidir. Nessas circunstâncias, não dá para ficar empinando pipa, tem que mergulhar com coragem e convicção.

Temer aposta na medida para ganhar alguma musculatura como candidato e concorrer à reeleição este ano?

Não houve, por parte de nenhum membro do governo, outro interesse senão servir o Brasil e o povo.

Mas não há como negar que o governo mudou o ‘drive’ da discussão, do fracasso da reforma da Previdência para o debate da segurança.

Nossa preocupação não é medir o “drive” do debate. O que há é um problema grave de desorganização social em função da segurança pública que exige das autoridades assumir riscos e colocar em plano absolutamente secundário interesses eleitorais.

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